domingo, 14 de setembro de 2008

Criativos e Globalizados

A Revolução Industrial tornou as organizações maiores e mais complexas, trazendo consigo avanço tecnológico e uma visão focada para a lucratividade e produtividade, onde homens já não se identificam com o produto de seu trabalho. Cada vez mais percebemos em nossos lares e local de trabalho, as amarras da tecnologia bitolando fortemente o ser humano, individualizando-o, dificultando seu contato e relacionamento com os demais, mutilando indiretamente a criatividade, a imaginação, a percepção e a espontaneidade. Uma grande parte de nossas vidas é gasta nos domínios da conformidade: estamos sujeitos à considerável manipulação e ajustamento, e é bem possível que muitas das escolhas que nos estão abertas, são mais aparentes do que reais. O homem vai deixando de lado sua capacidade criadora para tornar-se a “engrenagem de uma máquina”. A experiência do homem urbano, metropolizado, funde-se com a tecnologia moderna. Parece que o ritmo das máquinas impõe um novo ritmo e um novo tempo para o ser humano. Qual a questão mais vital para as empresas hoje? Capital? Estratégia? Produtos Inovadores? Tecnologia de Ponta? São todos eles, itens poderosos. Mas, subitamente, perdem a intensidade e a força quando confrontados com outro tópico: o talento. Nada é tão vital na agenda das “grandes” empresas, hoje, como o talento. O movimento de valorização das relações humanas no trabalho surgiu da constatação da necessidade de se considerar a relevância dos fatores psicológicos e sociais na produtividade, consequentemente, passou-se a valorizar as relações humanas no trabalho. Há um crescente rebuliço das pessoas e das empresas na busca pelo bem-estar e melhoria da qualidade de vida individual e corporativa, principalmente pelo fato de que, para sustentar o nível de qualidade dos produtos, é necessário ter funcionários saudáveis e capacitados. Não deve existir conflitos entre uma vida de encantos e de atividades práticas e produtivas, que podem servir uma a outra: uma deleitando o espírito e a saudável ambição, a outra confortando o coração.
Lygia Prudente

sábado, 13 de setembro de 2008

Saudades do Cine Palace (10)


Leia o texto ouvindo a trilha sonora de "Os 10 Mandamentos"

A cabine de projeção do Cine Palace era bem espaçosa e aclimatada e, na porta, o tradicional aviso “Proibida a Entrada”. Tinha uma escadinha e logo se via os dois projetores RCA-100, atrás dos quais havia a enroladeira, onde o operador rebobinava o carretel da parte que acabara de ser projetada. Ali mesmo, também, era feita a revisão dos filmes quando estes chegavam da transportadora, vindo de outro estado em sacos de pano, que traziam as latas de filmes, cartazes, fotos, certificado de censura e orientação para o projecionista. Em Aracaju, os filmes eram exibidos com algum atraso, muito arranhados, às vezes, cortados, com as perfurações estragadas, o que gerava muitas emendas, que se não fossem bem feitas, poderiam partir-se ou enganchar durante a projeção, ocasionando até a queima do filme. Quando isso acontecia, via-se na tela o fotograma se queimando. Nesta época as lâmpadas eram de carvão. Duas varetas opostas, que funcionavam como pólos positivo e negativo, iam se queimando à medida que as duas pontas se juntavam. Quando as mesmas se afastavam, a luminosidade enfraquecia e o filme que estava sendo projetado escurecia na tela, causando grande protesto da platéia, que batia palmas e assobiava. Outra reclamação mais comum era quando a fita tinha uma emenda mal sincronizada nas perfurações e o quadro saía do lugar, subindo e cobrindo a legenda. No Palace, antes de ser feita uma adaptação na janela de projeção, uma mesma lente servia para o formato de tela standard (pequena e quadrada) e a cinemascope (retangular, tomando toda a tela), dando um efeito bastante interessante de abertura de formato de tela, quando da passagem do cine jornal para o filme principal em cinemascope. No chão, próximo de cada um dos projetores, ficavam as latas de filmes com os rolos, ordenadas em partes, distribuídas em certa quantidade para cada projetor. Os filmes, normalmente, vinham com seis a oito rolos (partes). Outros, como Os Dez Mandamentos (1956), com Charlton Heston e Yul Brynner, com duração de três horas e quarenta e dois minutos, chegavam a ter mais de treze latas de filme (partes). Quando estava para acabar um dos rolos, o outro já era colocado e começava o trabalho de sincronização. Duas marcas no fotograma do filme, aqueles círculos nos cantos da tela espaçados por trinta segundos, eram a deixa para os operadores saberem a hora de acionar o pedal, que no caso dos projetores do Palace, ficavam na sua base, que fechava o foco do que estava encerrando a parte e abria o que iria iniciar-se, fazendo com que a sincronização fosse perfeita, não se notando a mudança de parte. Uma vez, aconteceu de um projetor quebrar e demorou a ser consertado, mesmo assim o cinema não interrompeu as sessões, só que ficava parando o filme toda vez que o rolo acabava, para mudar a parte em um só projetor. A pensar que hoje nos cinemarks da vida, além de ser um só projetor, não se usa mais carretéis, e sim grandes pratos onde se coloca todo o filme, funcionando automaticamente, só precisando do projecionista para colocá-lo, isto por enquanto, porque quando a projeção for digital e depois via satélite, aí nem projecionista terá. Cada vez mais o cinema perde a magia e o romantismo de uma época que não volta mais, deixando os cinéfilos sem seus fetiches, www.fetichedecinefilo.blogspot.com .

Armando Maynard

domingo, 7 de setembro de 2008

Cine Aracaju

Arte: Lygia Prudente

“Cine Aracaju, a melhor programação da cidade”, era esse o slogan, deste que era o menor cinema do centro da cidade, situado à Rua Laranjeiras, Aracaju/Sergipe, onde hoje existe um estacionamento. Quando foi adquirido pelo empresário José Queiroz, teve modificada toda a fachada e a sala de espera, sem que fosse preciso interromper o seu funcionamento. Ao sair da sala de espera, subindo pequenos degraus havia um grande espelho, onde as garotas gostavam de ficar se arrumando. Do lado esquerdo havia uma cigarra que servia para o porteiro avisar ao projecionista a hora de iniciar a sessão. Na sala de exibição foram trocadas também as cadeiras de madeira por pequenas poltronas com estofados no assento, encosto e braços, novidade nos cinemas da cidade. Foi trocada também a tela que era de formato acadêmico (quadrada) para cinemascope (retangular). Possuía dois projetores Philips Holandês, mono, que foram adaptados, depois, para som estereofônico. Dos filmes polêmicos que foram exibidos pelo Aracaju, três se destacaram: Laranja Mecânica (1971) com Malcolm McDowell , que por ter cenas de nudez explícita, só foi liberado depois que a companhia colocou na cópia, com recursos de laboratório, bolinhas pretas cobrindo os órgãos sexuais dos protagonistas. Isto provocava risos na platéia quando da sua exibição, pois viam-se as bolinhas correndo de um lado para o outro, na frente dos atores, a fim de cobrir os órgãos sexuais dos mesmos; O Último Tango em Paris (1972) com Marlon Brando, filme que por muitos anos, ficou proibido, pela censura, de ser exibido no Brasil; Platoon (1986), ganhador de quatro Oscars, um dos relatos mais emocionantes dos horrores da Guerra do Vietnã, dirigido pelo ex-combatente Oliver Stone; outro filme que a censura teve uma recaída, por causa das cenas de violência foi Cobra (1986) com Sylvester Stallone. Os cortes foram feitos na cabine do cinema, pelo próprio projecionista, seguindo orientações vindas de Brasília, descrevendo as cenas que deveriam ser excluídas. Na Semana Santa era sempre reprisado o filme sobre a morte de Cristo, nos Cinemas Aracaju e também Rio Branco (que era arrendado à Zé Queiroz), com uma única cópia para ambos. Por isso, era necessário que os cinemas começassem as sessões em horários diferentes, dando tempo para que um funcionário da empresa ficasse transportando, a pé e por partes, as latas do filme de um cinema para o outro (na época jovens comentavam que algum dia iam fazer com que os dois cinemas parassem, segurando o funcionário no percurso entre um cinema e outro). Dos épicos, lembro-me do filme A Bíblia... no Início (1966), de John Houston, assistido com grande desconforto, pois havia um grilo dentro do cinema. Bons tempos! Hoje o desconforto é o barulho do toque do celular.

Armando Maynard